26 junho 2011

Medina Carreira



O Professor Medina Carreira tem-se tornado conhecido nos últimos anos pelo seu diagnóstico extraordinariamente pessimista da economia e da sociedade portuguesa e pelos seus constantes apelos a uma governação responsável.

O diagnóstico que ele faz da sociedade portuguesa é, basicamente, certeiro. Porém, o mínimo que se pode dizer acerca dos seus apelos é que têm sido largamente ineficazes. Esta entrevista ajuda a esclarecer o erro essencial de Medina Carreira. Ele acredita na democracia e até foi membro do PS até há poucos anos. Já pensou em candidatar-se a Presidente da República, mas abandonou a ideia. A razão só pode ser uma: porque não acredita que o povo português - a democracia - alguma vez elegesse para o cargo uma pessoa responsável como ele.

Este é o erro. Em Portugal, não se pode acreditar na democracia, e ao mesmo tempo esperar, a prazo, uma governação responsável. Nem em Portugal, nem em qualquer outro país de tradição católica (ou ortodoxa). Alguém conhece, no presente ou no passado, um país de tradição católica (ou ortodoxa), vivendo em democracia, e conseguindo, a prazo (digamos, ao fim de cinquenta anos de democracia) ter uma governação reponsável? Eu não conheço.

Medina Carreira, certo embora no diagnóstico, apela a um mundo fantasioso, um mundo que a experiência tem repetidamente mostrado ser impossível - um mundo católico e, a prazo, bem governado em democracia - e o seu pensamento acaba assim por ser mero wishful thinking.

Uma palavra final acerca de Salazar. Salazar não era apenas um bom gestor. Era um homem de elite, e isso faz toda a diferença. Mas também não convém exagerar as suas capacidades porque os seus êxitos só em parte se devem à sua pessoa. Ele foi para primeiro-ministro chamado pelos militares do 28 de Maio e teve sempre o poder dos militares pelas costas. Nestas condições é muito mais fácil governar um país católico, embora Salazar tenha tido o mérito de saber como o fazer - um mérito que, por exemplo, o Marquês Pombal, com poderes semelhantes, não teve de modo sequer comparável (porque o Marquês de Pombal era um retinto homem do povo). Na realidade, Salazar foi chamado ao poder para tirar o país da ruína ou da desgovernação em que a democracia mais uma vez, desde 1820, o tinha deixado.

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