27 fevereiro 2006

carnaval

o insurgente

O Insurgente completa hoje o seu primeiro ano de vida. Parabéns ao André Azevedo Alves e aos seus 20 (!) camaradas de profissão. Um ano é muito tempo na blogosfera e transforma-se numa imensidão quando se mantém um diário com a qualidade informativa e temática, e a elevação que O Insurgente possui. Além de ser, desde o princípio, um dos blogues liberais mais consistentes e equilibrados que conheço, O Insurgente demonstrou, com os seus 21 colaboradores, que a vocação de uma marca de sucesso na blogosfera é a expansão e a abertura.
Um abraço a todos e continuem o excelente trabalho.

já está à venda

Parabém ao Paulo Pinto Mascarenhas, ao André Azevedo Alves e a todos os colaboradores da revista, por mais este número da Atlântico.

26 fevereiro 2006

tecnologia

A nova coqueluche do regime tem nome: tecnologia. Sócrates profetizou-a durante a campanha eleitoral e dá, agora no governo, passos rápidos e decididos para a alcançar.
Primeiro, o Plano Tecnológico concebido, ao pouco que se sabe e pode supor, por mentes brilhantes e privilegiadas para a nossa suprema felicidade, algures num gabinete ministerial.
Depois, a vinda de Bill Gates, o Messias em pessoa, como que para dar a sua bênção ao arrojado empreendimento. Rodeado de ministros e de autoridades, foi louvado e elevado às alturas da devoção tecnológica nacional entre discursos, comendas e cânticos de gratidão.
Por fim, o MIT. Leiam bem: M-I-T. Três letras, três iniciais do nome do mais prestigiado instituto de investigação tecnológica do mundo, ontem mesmo chegado a Portugal para nos cobrir de conhecimento, sabedoria e, claro, de tecnologia.
E, no entretanto, a OTA, o TGV e a net espalhada por todas as escolas públicas que ainda não encerraram, projectos em execução para comprovarmos a mestria já adquirida e que nos abrirão à globalização e ao mundo.
O Portugal que não fez a tempo a sua Revolução Industrial, que sempre se atrasou na construção das estradas e das outras vias de comunicação, que tem Universidades que se regem ainda pelo método pombalino do ensino sintético, histórico e compendiário, o Portugal dos cérebros em fuga para os EUA, este país de recursos parcos e mal encaminhados, sem economia, com desemprego e dívida pública crescentes, entrou com o pé direito do terceiro milénio graças ao espírito visionário e futurista dos seus governantes.
Agora é que isto vai ser!

24 fevereiro 2006

fim-de-festa

A tese de Constança Cunha e Sá de que o problema da oposição e o estado de graça do governo se devem à memória do governo de Santana Lopes não é suficientemente explicativa da situação anímica e larvar em que se encontra a direita indígena. Dizer que Santana marcou para além do seu momento é dar-lhe um protagonismo político que verdadeiramente não teve enquanto governante. O «governo Santana» foi uma espécie de fim-de-festa aziago, quando a malta já está toda com os copos e não sabe bem o que faz. Enfim, a grande barraca, é certo, mas somente uma barracada final.
Explicar as coisas deste modo é, por isso, ver apenas a ponta do iceberg e esquecer o que está de baixo de água. Porque, o que verdadeiramente deixou a direita em estado de choque não foi o «governo Santana» mas aquele que o precedeu. As expectativas criadas pelo fim do guterrismo e o que veio depois. As promessas do «choque fiscal» e o discurso catastrofista com que se justificou o seu engavetamento. Os sacrifícios pedidos e a jactância da Senhora Ministra das Finanças. E, por fim, a despudorada debandada do Primeiro-Ministro rumo a Bruxelas, sem uma explicação proporcional ao que nos prometera, ao que nos exigira e ao estado em que nos deixou.
A direita perdeu a fé com o governo de Durão Barroso. Santana foi somente um fim-de-festa divertido.

23 fevereiro 2006

praxeologia - ii

(Ao Rodrigo Moita de Deus e aos demais socialistas da blogosfera)

A mentalidade socialista, colectivista e estatista incorre sempre num pressuposto equívoco: o da existência de agregados humanos e de entidades colectivas dotadas de vontade própria, autónoma, responsável e independente dos indivíduos que as compõem. È vulgar a ideia, fundada na vulgata sociológica, de que «o todo transcende a simples soma das partes», assim como aquela outra de que esses conjuntos se movimentam por finalidades colectivas e nunca por meros interesses particulares.
Daqui à convicção da bondade natural desses fins e da utilidade dos agregados que os representam, é um pequeno passo. Pois se o geral prevalece sobre o particular, o colectivo sobre o individual, o todo sobre as partes, é porque existirá uma racionalidade nesses agregados que só eles podem intuir e operacionalizar para bem de todos.

A ideia do «interesse público» assenta nestes pressupostos. A autonomia deste valor sobre os interesses dos indivíduos, também. Em Portugal, país que há muito absorveu a mentalidade do colectivismo, este dado é adquirido ao ponto de se aceitar que o próprio «interesse colectivo» possa colidir com os interesses individuais e até mesmo os violente. Na nossa forma de ver as coisas o que é público é bom e o que é privado é mau. O que é público é de todos e o que é privado é só de alguns. O que é público representa o altruísmo dos grandes ideais abnegados e desinteressados, enquanto que o interesse privado é sinónimo de egoísmo movido pelo baixo escrúpulo e pela cega ambição de lucros desonestos.

Esta visão mítica das entidades públicas sustentou-se, durante muito tempo, na divinização dos governantes, ou, pelo menos, daqueles que exerciam as funções de maior soberania. Quem tinha a seu cargo essa ciclópica tarefa de tratar da comunidade, não podia ser simplesmente humano, ou tão humano como os demais. Nas sociedades laicas dos nossos dias, os sinais de distinção da elite governante continuam bem visíveis e permanecem fundados na suposição de que quem nos governa está acima dos simples mortais que são governados. A velha máxima do «se soubésseis o que custa governar, queríeis ser governados toda a vida», representa o axioma do fardo que representa para o homem público a desinteressada tarefa de cuidar de todos nós e da nossa felicidade terrena. Porque, no céu, semelhante encargo cabe, como é sabido, a Deus Nosso Senhor.

Em consequência disto mesmo, é característica das sociedades estatizadas a desresponsabilização do indivíduo. No seu paroxismo máximo, este esvaziamento da natureza humana levou à implosão dos sistemas comunistas. Em menor grau, conduz ao desinteresse e ao alheamento dos cidadãos em relação ao que poderiam ser os seus próprios interesses, porque a liberdade de ser ele a determiná-los e a escolhê-los se encontra extraordinariamente condicionada por entidades o substituem nessas funções. Quando o Estado (o governo e os entes públicos) impõe encargos aos cidadãos e lhes reduz a propriedade, está a limitar-lhes a sua liberdade e a possibilidade de serem eles a escolherem o que pretendem para si próprios e para o que deveria ser seu. Está a assumir que sabe melhor do que eles o que lhes é mais conveniente e, por consequência, a desresponsabilizá-los dos resultados efectivamente atingidos por essas decisões. Quando as coisas correm mal (como quase sempre sucede) o expediente comum é mudar de governo, ou seja, substituir o pessoal político velho por pessoal político novo. Os resultados deste tipo de operações (a que os mais ilustrados chamam paretianamente «circulação das elites») é conhecido e as últimas décadas de Portugal evidenciam-nos bem.

Espantosamente, os estatistas raramente perguntam porque tudo corre invariavelmente mal e porque estranho motivo cada solução que se suceda costuma agravar a herança recebida. Alguns recorrem a explicações igualmente fundadas em entidades agregadas: à esquerda, o «sistema», os «ricos», os «patrões»; à direita, o «sistema», os «sindicatos», os «media». Alguns, mais sofisticados levando a mitificação da responsabilidade colectiva ao seu máximo expoente, alegam que a culpa de não resolvermos os nossos problemas vem de fora, do estrangeiro, da União Europeia, do Euro, do petróleo, dos «americanos» e dos «chineses». Ou seja, dos outros. Nossa (deles) é que nunca é.

Na década de 40 do século passado, Ludwig von Mises tentou criar uma nova ciência que teria por finalidade a teorização geral da acção humana. Independentemente da fragilidade evidente de procurar encontrar uma explicação geral para fenómenos complexos (que, de resto, Mises acabou verdadeiramente por nunca enunciar) a sua Praxeologia (na qual a Economia teria lugar como um dos ramos específicos da acção humana) teve o imenso mérito de dissecar os comportamentos sociais e demonstrar que eles são sempre individuais e nunca colectivos.

Efectivamente, como escreveu no seu principal tratado sobre Praxeologia (Human Action), «toda a acção humana é conduta deliberada»*, sendo que «o homem, ao actuar, aspira a substituir um estado menos satisfatório por outro mais satisfatório». Por outro lado, a acção humana baseia-se sempre em escolhas e preferências concretas, feitas racionalmente (não «sensata» ou «eticamente») pelos indivíduos. Não existem, por natureza, comportamentos ou acções colectivas. A exteriorização de uma «decisão colectiva» é sempre fruto de vontades individuais, na medida em que «os entes colectivos operam, iniludivelmente, por mediação de um ou de vários indivíduos, cujas actuações são, de imediato, atribuídas à própria colectividade». Ou seja: «a vida colectiva plasma-se nas actuações de quem a integra».

Isto não significa, note-se, que a Praxeologia de Mises renegue a existência de evidências como o Estado, os partidos e as ideologias, as religiões, ou outras entidades agregadoras de indivíduos. O que quer dizer é que essas entidades não têm vida própria, decisão própria, nem interesses próprios. Os indivíduos que as compõem em cada momento, esses sim, têm vida própria, vontade própria, interesses próprios e tomam decisões que afectam universos indeterminados de indivíduos sem terem em consideração os seus verdadeiros interesses. Não necessariamente por má fé (o que também se verifica), mas pela natural incapacidade de os conseguir determinar e de encontrar os meios adequados para os satisfazer.

É deste subjectivismo metodológico na análise dos comportamentos sociais, que também parte o liberalismo. Por compreender que a acção humana individual sustenta as relações humanas e a vida social, é que defende que qualquer intermediário que lhes possa ser aposto prejudica mais do que beneficia. Por isso, o liberalismo não reconhece ao Estado ou a qualquer outro conjunto sociológico, mais dignidade ou valor do que o de cada um dos indivíduos que os constituem. E, se assim é, mais vale que estes sejam livres para escolher, do que se vejam sistematicamente a seguir as escolhas que outros fizeram por si.

Enquanto persistirmos em nortear a nossa vida social pelo colectivismo e pelo intervencionismo estadual, continuaremos a ser um pobre país triste e subdesenvolvido.

* Nossa tradução.

praxeologia - i



Retirado, com a devida vénia, do Le Québécois Libre

21 fevereiro 2006

variações sobre um tema fascinante

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens vão à Versalhes.

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens comem chocolates Regina.

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens terão, mais cedo ou mais tarde, diabetes.

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens gostam de mulheres doces.

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens têm excesso de peso.

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens salivam quando vêem um cozido à portuguesa.

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens comem arroz doce.

O capitalismo assenta na premissa infantil de que por serem gulosos todos os Homens compram acções da RAR.

dois pesos, duas medidas

Como explicou Karl Popper, o «status» de um postulado, de uma asserção ou de uma hipótese científica, reside na sua resistência às sucessivas tentativas de refutação ou de falseabilidade a que seja submetida. A veracidade dos seus conteúdos será, assim, tanto mais firme quanto subsista ao maior número possível de provas de falseabilidade.
Este critério ou método científico tem, como Popper também demonstrou, uma consequência evidente: a Ciência nunca se esgota, nem se encerra em si mesma e nas suas leis, devendo ser um universo infinito e permanentemente aberto a novas provas e a novos testes que a ponham em causa. Nietzsche dizia, a outro propósito, que «o que não me mata fortalece-me». É exactamente isto que aqui se passa.
Diga-se, por último, que é graças a este espírito que a Ciência tem progredido e que, pelo contrário, sempre que ela se considerou suficiente, estagna.
Este método de trabalho aplica-se, naturalmente, a todos os ramos científicos. Como o João Mirandaaqui demonstrou à exaustão, também a História não pode excluir-se desta metodologia, mesmo nos casos em que nos pareçam mais inconcebíveis as hipóteses levantadas. Se alguém, por absurdo, nega a evidência, há que responder-lhe com as provas dessa evidência. No caso do Holocausto, elas abundam e são quase inesgotáveis: fotografias, documentos autênticos, relatos de testemunhas, entre muitas outras, são mais do que suficientes para refutar qualquer teoria que diga o contrário.
Na prisão de David Irving subsiste, porém, para além do direito inegável à refutação de um postulado científico da nossa História Contemporânea, uma óbvia questão de liberdade de expressão. Por mais abomináveis que sejam as opiniões de um indivíduo, numa sociedade livre ele terá sempre direito a tê-las, a defendê-las, a divulgá-las e a manifestá-las. Desde que, obviamente, não colida com outros direitos individuais, o exercício deste direito terá de ser legalmente protegido. Em caso de conflito, como em tantas outras circunstâncias da vida social, os tribunais são o sítio certo para as devidas reparações e compensações.
Como é evidente, numa sociedade livre os defensores de Hitler, de Estaline ou de Mao não poderão ser limitados no seu direito de defenderem as personagens que, vá-se lá saber por que estranha razão, veneram. Embora e curiosamente, as democracias ocidentais se tenham habituado a conviver tranquilamente com os defensores das ditaduras comunistas (no que fazem muito bem) e a perseguir aqueles que admiram o III Reich (no que fazem muito mal).
Dois pesos e duas medidas que, sem dúvida, não beneficiam a liberdade, nem engrandecem a tão reclamada tolerância das democracias ocidentais.

20 fevereiro 2006

roast beef

Um simpático grupo de amigos teve a amabilidade de me sugerir que escrevesse umas linhas sobre a OTA e o TGV, com a finalidade de as anexar a um trabalho que têm na forja.
Confesso que nunca me ocorrera dissertar sobre semelhantes coisas, menos ainda numa perspectiva voluntarista e militante de quem está contra a execução dos projectos, como parece ser a posição geral dos meus amigos Blasfemos. Descreio, como eles bem sabem, do voluntarismo. Julgo que, em política, raramente as nossas intenções produzem os resultados pretendidos e, frequentemente, conseguem atingir precisamente efeitos contrários.
Também me custa perder tempo com inutilidades e com coisas inevitáveis: tal como a morte, o Centro Cultural de Belém, a Expo-98 e os estádios do Euro 2004, também a OTA e o TGV são já dois factos iniludíveis, dois empreendimentos irrenunciáveis e dois símbolos consumados do regime, que já o eram mesmo antes de o serem. De modo que, esta preocupação dos Blasfemos parece-me mais do âmbito especulativo e filosófico, do eterno dilema existencial do ser e do dever ser, do que propriamente uma coisa com efeitos práticos. Mas, como sempre fui apreciador de filosofia e aos amigos nada se recusa, aqui vai.

Sobre a OTA não tenho nada a dizer. Acho que o país não merece ter mais do que um aeroporto no Algarve (por causa dos turistas) e de uma pista para avionetes na região centro (para o que der e vier). De Norte a Sul, isto faz-se em meia-dúzia de horas de automóvel, assim findem os limites de velocidade e o Estado nos deixe andar por aí a 200 e mais quilómetros por hora, nos potentes veículos que, para efeitos de IA, nos autoriza a parvoniamente comprar. Daqui para o estrangeiro já ninguém vai, graças à crise económica que nos proíbe de ter férias em destinos paradisíacos ou negócios nas grandes capitais financeiras, e de lá para cá (com excepção do dito Algarve) também não me parece que o movimento seja muito, porque, do Haiti ao Quirguistão, existem inúmeros sítios mais aprazíveis para visitar ou estabelecer negócios. Bem vistas as coisas, até nem é nada mau, porque, obrigando-nos a ficar por cá e impedindo a invasão dos estrangeiros (com excepção do Algarve), reforçamos o sentimento de amor pátrio que nos abandonou durante algum tempo e tardava em regressar.
Mas, já quanto ao TGV tenho uma coisa importante a dizer. Ou melhor, uma enérgica exigência a fazer. Não quero saber se é caro ou barato, se anda depressa ou devagar, se passa por cima ou por baixo da OTA, se liga o Porto e Lisboa a Madrid ou a Xangai. Só me interessa saber se vão ou não repor uma extinta carruagem VIP que existia nalguns comboios antigos da CP que faziam Porto-Lisboa-Porto, vai lá para uns bons vinte anos, onde se servia o mais fantástico roast bife com batata palha e legumes salteados que alguma vez comi na vida. As condições da carruagem eram pindéricas, o preço da refeição elevado e a ementa sempre a mesma. Porém, a excelência da carne e da sua preparação gastronómica era brutal e inesquecível.
Comparado com as odiosas «refeições» que os comboios agora servem, ou com as sanduíches e snaks que os seus manhosos bares vendem a preços especulativos, o antigo roast beef da CP era um manjar divino e um ex libris civilizacional. Se o TGV vier com roast beef, eu voto a favor. Se não, que se lixe!

15 fevereiro 2006

oportunidade de negócio

Ministro italiano estimula sector têxtil nacional.

14 fevereiro 2006

a refundação da direita

Direcção do PSD quer saber qual será o futuro do albergue do regime.
Uma intervenção oportuníssima, em defesa do interesse nacional.
Parabéns, Dr. Mendes.

momentos de glória

Embaixador do Irão em Lisboa elogia Freitas do Amaral e disserta sobre a «mentira» do holocausto. Fantástico!

um erro liberalmente fatal

A leitura do último livro de Francis Fukuyama, publicado em 2004 nos Estados Unidos, e traduzido este ano para português com o assustador título «A Construção de Estados – Governação e Ordem Mundial no Século XXI» (diga-se, em abono da verdade e da editora, que se trata da tradução ipsis verbis do título original), provocou-me uma sensação de desconforto e mal-estar intelectual.
Vá-se lá saber porquê, Fukuyama goza nalguns círculos da fama de ser um autor liberal. Talvez por ter escrito um livro (vincadamente historicista) onde afirmava o domínio global e definitivo do que entendia ser a «democracia liberal», talvez por citar e referir a espaços Hayek e Mises, ou, quem sabe, por ir dizendo que os Estados dispõem de funções excessivas e que há que fazer com que elas diminuam. Isto que aparentemente assinalaria o princípio de um espírito liberal é, contudo, claramente insuficiente, ou mesmo perversamente perigoso, como, de resto o próprio Fukuyama cuida de demonstrar no livro referido.
A tese desenvolvida ao longo dessa obra é simples de enunciar: os Estados contemporâneos têm vindo a exceder as funções sociais que desempenham e, por isso, há que equacioná-los em funções determinadas e socialmente úteis, mas, uma vez feita essa adaptação, têm de estar dotados de instituições públicas fortes, sob pena de baquearem e tornarem-se ineficientes, senão mesmo perigosos por insuficiência de poder. Ao longo das quase cento e cinquenta páginas da edição portuguesa, o autor não se cansa de repetir esta ideia. Quando, por exemplo, faz referência às reformas liberalizadoras da década de 80 e, em parte, de 90, afirma que «o verdadeiro problema era que, se os Estados precisavam de ser reduzidos em certas áreas, precisavam simultaneamente de ser fortalecidos noutras». Mais adiante, acrescenta: «Houve muito poucos alertas da parte dos responsáveis sediados em Washington sobre os perigos da liberalização na ausência de instituições adequadas». E, por fim, concluí: «Mas o que é mais urgente para a maioria dos países em desenvolvimento é aumentar a força básica das suas instituições públicas, para que desempenhem aquelas funções fundamentais que só os Estados podem desempenhar».
Fukuyama chama a isto a «teoria da construção dos Estados». Pondo de parte a imediata crítica liberal que necessariamente teria de ser feita a esta e a quaisquer outras formas de engenharia ou construtivismo social e político, quedemo-nos pela análise dos próprios erros da sua teoria e vejamos porque razão ela é, na verdade, uma tese estatista, intervencionista e anti-liberal.
Comecemos por recordar outro sociólogo, Max Weber, insuspeito de inclinações liberais, e vejamos o que ele nos diz sobre o Estado e os seus célebres «fins»: «Não é possível definir uma associação política – nem sequer o Estado – pela alegação do fim da acção associativa. Desde a solicitude pelos meios de subsistência até à protecção da arte, desde a garantia da segurança pessoal até à administração da justiça, não houve fim algum que ocasionalmente não tenha sido perseguido pelas associações políticas. Por isso, só pode definir-se o carácter «político» de uma associação pelo meio – elevado em certas circunstâncias em fim em si – que, sem lhe ser peculiar, é decerto específico e indispensável à sua essência: a violência» («Conceitos Sociológicos Fundamentais»)
Ora, chegados a este ponto parece evidente que enquanto mantivermos a perspectiva de que o Estado tem que ser forte para nos assegurar a liberdade, a propriedade, os nossos direitos fundamentais e outros que eventualmente sejam socialmente contratualizados, estaremos inevitavelmente a deixar ao juízo unilateral de quem governa o que há-de fazer aos seus governados. Isto é, a escolha dos «fins» que deverá prosseguir, «a bem da Nação». Esta tem sido, de facto, a história recente do estatismo: a convicção da utilidade social do Estado e da inoponibilidade de limites rigorosos à sua actuação, sobretudo, da sua quase ilimitada intervenção legislativa.
Uma teoria liberal não pode, por conseguinte, propor a «construção» e o fortalecimento do Estado. Pelo contrário terá de desenvolver uma teoria de «desconstrução» e de enfraquecimento do monstro em que ele se tronou no século passado. Para isso só há uma solução: obrigar o Estado a privatizar ao máximo possível o sector público, permitir e aumentar a liberdade negocial e contratual assente no direito privado, impor limites constitucionais ao intervencionismo estatal. Não é tarefa fácil, como, em Portugal, estamos a ver pelas reacções à OPA sobre essa empresa «privada» que é a PT, mas é o único possível.
Em suma, do que as sociedades modernas precisam se querem aumentar a sua liberdade, é de instituições privadas fortes e não de instituições públicas fortes. Este erro de Fukuyama, que afecta muita gente de direita, sobretudo da direita mais conservadora, consiste em julgar que o Estado, ele mesmo, imporá limites razoáveis ao seu poder. Ora a racionalidade do poder, como bem evidenciou Weber (e, já agora, Bertrand de Jouvenel e Hannah Arendt), é o crescimento e a expansão. Pensar nesses termos é um erro grave. Um erro liberalmente fatal, em conclusão.

não se faz!

Quando tínhamos, ao fim de tantos esforços infrutíferos, conseguido finalmente entrar em grande na guerra contra o terrorismo, eis que os holandeses nos fazem esta desfeita. Ingratos!

a tribo do futebol

No meio da algazarra provocada pelas caricaturas de Maomé e pela OPA da PT, o governo lá aprovou a nova lei das rendas.
Ouvidas as estruturas representativas dos senhorios e dos inquilinos, uns e outros manifestam-se avessos ao teor da lei, os primeiros porque entendem que ela beneficia os segundos e estes por acharem que ela os prejudicará em favor dos primeiros. Ou seja, como sempre e uma vez mais, não se entendem e parece que não se querem entender.
Não será altura do Ministério da tutela marcar uma «peladinha» entre senhorios e inquilinos?

13 fevereiro 2006

guerra de civilizações ii

O editorial de hoje de José Manuel Fernandes no Público (link directo indisponível) põe o dedo na ferida: está em curso uma guerra de civilizações planeada, preparada e executada por responsáveis do mundo islâmico, nomeadamente aqueles que recusam a «modernidade» e a «democracia».
Trata-se, contudo, não de um conflito entre dois blocos territorialmente delimitados em busca de mais espaço, recursos, poder ou influência geográfica, mas de dois tipos radicalmente distintos de organização política e social, inspirados por valores e princípios diametralmente opostos. O mundo islâmico assenta e assentou sempre sobre sociedades fortemente hierarquizadas, dominadas por autocratas ou oligarquias materialmente privilegiadas, que exploram pelo terror da força bruta ou pelo temor da religião multidões de miseráveis. Sociedades onde os direitos mais elementares não são reconhecidos, as mulheres estão completamente desprovidas de direitos e vivem ainda numa condição de semi-escravidão, a miséria material predomina, e onde o Estado tem religião oficial. Nestas condições, o que os EUA fizeram no Afeganistão, mas sobretudo no Iraque, impondo as regras da democracia, dando início a um processo de igualdade individual perante a lei, pode ser, se correr bem, o princípio do desmoronamento desse mundo e dessa «civilização»: o Médio Oriente não pode ter um país democrático que sirva de exemplo aos outros. Para isso, já chega Israel.
É esta a razão desta guerra, por ora, de propaganda e de comunicação. O «Islão» está a dizer-nos que não quer os valores ocidentais e está a tentar demonstrar aos seus povos que, afinal, esses valores são bem piores do que os seus, porque não respeitam nem Deus, nem os homens. Daí o episódio das caricaturas e, agora, o filme do espancamento de iraquianos por militares ingleses.
Em boa verdade, quem começou esta guerra, ao contrário do que afirma o director do Público, fomos nós e não eles. Porque existimos, porque recebemos milhões de cidadãos provenientes desse mundo que cá vivem livremente, e porque estamos a tentar democratizar o Iraque. E ainda bem que assim é.

para avivar a memória ao mne

as pilinhas dos agressores

Freitas do Amaral: «As agressões do Ocidente ao Oriente têm sido maiores que as agressões deles contra nós».
Declarações prestadas às televisões, via Bradiencefalia, com a devida vénia.

12 fevereiro 2006

afinal, sempre existem coincidências

Assinalemos apenas os factos.
Umas caricaturas de segunda categoria, publicadas num jornal de terceira, num país periférico da Europa comunitária, incendiaram o mundo islâmico, deprimiram a Europa, fizeram ministros de países democráticos afirmar disparates sobre a liberdade, levaram ao encerramento de um site sueco pelas autoridades locais, fecharam embaixadas e provocaram manifestações públicas nos países europeus de dezenas de milhares de muçulmanos que por lá vivem livremente. Pelo caminho, alguns líderes islâmicos ofereceram ouro pelas cabeças dos «criminosos» caricaturistas e pela pele de cidadãos dinamarqueses que eventualmente sejam capturados nos países islâmicos, o que fez o governo da Dinamarca aconselhar aos seus concidadãos o abandono da maior parte desses países, entre eles, da própria Indonésia. Hoje mesmo, um jornal norueguês que publicou os blasfemos desenhos pediu formalmente desculpas à comunidade muçulmana por o ter feito, e soube-se também que uma sondagem realizada na Dinamarca condenou maioritariamente a publicação das caricaturas e a grave ofensa que elas veicularam. Note-se que os desenhos tinham sido originariamente publicados em Setembro, muito tempo antes destas reacções «espontâneas» de repúdio contra o mundo ocidental, num país onde vivem livremente milhares de muçulmanos, sem que se tenha tido notícia de quaisquer protestos imediatos.
Duas semanas depois de rebentar a crise, surge um novo documento a «provar» a «selvajaria» dos ocidentais e o desrespeito que, afinal, demonstram ter pelos direitos humanos: um vídeo com soldados ingleses no Iraque a espancarem alguns jovens iraquianos que se manifestavam contra a sua presença. Tony Blair já anunciou que irá proceder a um inquérito rigoroso e que os responsáveis serão levados à justiça. Não se adivinha, porém, que esta intenção do primeiro-ministro britânico consiga acalmar a indignação que, a Oriente e a Ocidente, as imagens já começaram a provocar. O Ministro Freitas do Amaral ainda não disse nada, mas não tardará certamente a fazê-lo, para nos tranquilizar as consciências e pôr de bem com a vida. Mais uma vez, é de notar que o vídeo, indiscutivelmente verdadeiro, tem já dois anos de existência, surgindo agora no seguimento imediato da crise provocada pelas caricaturas.
Afinal, ao que parece e ao invés do que se julgava, sempre existem coincidências. Aguardemos temerosamente pela próxima.

11 fevereiro 2006

para que serve a pesc?

Desde 1 de Novembro de 1993, quando entrou em vigor na Europa comunitária o Tratado de Maastrich, foi criada uma nova entidade - a União Europeia - que incorporava três pilares organizacionais diferentes, com finalidades e instrumentos de actuação distintos: o primeiro pilar, ou o pilar comunitário, que reunia as três Comunidades instituídas na década de 50 (CECA, CEE e CEEA); o segundo, que criava uma nova área de actuação que se designou por PESC, a Política Externa de Segurança Comum; e o terceiro, que igualmente lançava a Europa para domínios inovadores, que estão actualmente limitados à cooperação policial e judiciária entre os Estados-membros.
Só no primeiro dos três pilares as instituições comunitárias funcionam com poderes supranacionais. Por isso, se diz que este é verdadeiramente o «pilar comunitário» da União Europeia. Aqui, as instituições legislam através de um procedimento comum de co-decisão (a Comissão propõe e o Conselho de Ministros e o Parlamento Europeu decidem), sendo a maior parte das matérias votadas por maioria qualificada. Compreende-se que assim seja, visto tratar-se aqui essencialmente da integração económica operada pelos Estados ao longo de mais de cinco décadas, com resultados discutíveis mas que, para todos os efeitos, são consensualmente considerados positivos. Nos dois restantes pilares funciona a intergovernamentalidade, isto é, as decisões continuam a ser tomadas pelos Estados no Conselho de Ministros ou no Conselho Europeu, por unanimidade.
Ora, se o primeiro pilar é estruturante e indispensável à própria ideia comunitária, se o terceiro pilar se tornou numa necessidade desde, pelo menos, a incorporação do acervo de Schengen nos Tratados operada pelo Tratado de Amesterdão (1999) que aboliu as fronteiras entre os Estados-membros, já a PESC carece de sentido e, pior ainda, desfavorece a imagem da própria construção comunitária.
Na verdade, a Europa não só não fala a uma só voz em matéria de política externa e de segurança, como faz questão de falar em muitos e diferentes tons, como bem se tem visto nas sucessivas crises com o mundo islâmico. A bizarria da existência de um Alto Representante para a PESC, actualmente o Sr. Solana, sem qualquer intervenção real na política internacional, e a tentativa da sua conversão em «Ministro dos Negócios Estrangeiros» no Tratado Constitucional, dá à União um tom patético que a Europa comunitária eventualmente não mereceria. Essa tonteria foi, de resto, uma das principais razões que levaram à inviabilização do Tratado Constitucional.
No impasse actual em que vive a União, em que já se entendeu que não lhe basta simplesmente tentar esquecer o malogrado Tratado para recuperar o balanço perdido, torna-se necessário expurgar o que está a mais e lhe retira credibilidade, e concentrar esforços no que ainda pode correr bem. Nessa medida, acabar de uma vez por todas com uma coisa que nunca existiu, a PESC, seria não só um acto de inteligência, como de bom senso. E a União, que nunca se entendeu ou entenderá em tais domínios, viverá certamente melhor com dois do que com três pilares.

10 fevereiro 2006

saramago que se cuide

José Saramago surge hoje no Público (link indisponível) a criticar os autores das célebres caricaturas de Maomé, chamando-lhes «irresponsáveis» e afirmando que «um desenho pode ser como lançar gasolina sobre o fogo».
Foi este sensatíssimo Saramago quem publicou, vai para mais de uma década, um livro incendiário chamado «O Evangelho Segundo Jesus Cristo», que custou a demissão do então Sub-Secretário de Estado da Cultura, António de Sousa Lara. Lara, crente entre os crentes, manifestou-se fortemente incomodado nas suas convicções e julgando interpretar o sentimento religioso nacional, tramou o conceituado autor e a dita obra num qualquer concurso literário internacional.
O que é verdadeiramente espantoso, analisados os acontecimentos à luz dos nossos dias, foi o facto da vítima de Saramago (o dito Lara), especialista em genealogia e heráldica, se ter publicamente declarado há alguns anos «descendente de Maomé». Vistas as coisas assim, a ofensa de Saramago não deixa de ser uma ofensa ao Profeta, ainda que por via hereditária, com consequências dramáticas: o seu irresponsável livro lançou gasolina e fogo sobre as barbas do descendente do Profeta, que jamais recuperou politicamente do sucedido.
Estivesse eu no lugar do Nobel e teria outras cautelas com o que dizia e escrevia. Quando não, ainda leva com uma «fatwa» em cima.

conflito de civilizações

A democracia e o sufrágio universal são dois instrumentos de regulação do sistema político e da vida social que nem sempre são devidamente apreciados pelos liberais. Frequentemente, tende-se para reduzir o valor de um e de outro, dizendo-se, do primeiro, que é um método imperfeito de promover alterações não violentas no aparelho de poder dos Estados, e, do segundo, que se trata de um mero critério de escolha dos governantes, que pode desvirtuar a qualidade dos mesmos em virtude da desigualdade individual do colégio eleitoral, da falta de formação e de informação, logo, de capacidade para fazer escolhas racionais. Hayek, que nesta matéria esteve longe de ser dos mais cépticos, chegou mesmo a propor outras formas de selecção dos governantes que não passavam pelo sufrágio universal em eleições cíclicas, e pronunciou-se frequentemente contra os excessos dos poderes democráticos. Uma coisa é, porém, defender que todo o poder soberano deverá ser limitado por valores estruturantes que são verdadeiramente metapolíticos e que a soberania não se pode considerar ilimitada por ser sufragada democraticamente, e outra bem distinta será invalidar os méritos do sufrágio universal, em razão dos excessos cometidos pelos actuais regimes democráticos.

É certo que a interpretação actual da soberania na generalidade dos países democráticos é de recorte rousseauniano, segundo o qual ela é una, indivisível e ilimitada, transferindo-se apenas por motivos de operacionalidade para um grupo limitado de governantes, que devem dispor dela como se fossem o conjunto dos cidadãos. Aqui reside o vício do totalitarismo democrático actual, que permite a invasão da quase totalidade da vida social, por se ter «esquecido» dos valores tradicionais do liberalismo e do constitucionalismo oitocentista, verdadeiros limites ao exercício do poder público. Contudo, o problema não reside no método de escolha dos governantes, mas na ausência de freios constitucionais ao exercício das funções de governo que sejam efectivamente respeitados, bem como na interpretação feita ao abrigo das ideologias das funções que este deve desempenhar. A igualdade dos cidadãos perante a lei, seja para elegerem, seja para serem eleitos, o ius sufragii e o ius honorum que já os romanos do período republicano clássico reconheciam a todos quantos tivessem a sua cidadania, é um valor político fundamental e não apenas um método de escolha entre muitos outros possíveis. O sufrágio universal é, assim, um princípio civilizacional partilhado por países que, a Ocidente e a Oriente, o souberam conquistar e deve considerar-se, também, património da tradição liberal, ainda que lhe não caiba por inteiro.

Da democracia não se poderá dizer coisa muito distinta. Mas vale a pena acrescentar que ela extravasa largamente os meros procedimentos de contabilização de votos ou de designação dos titulares da soberania; da existência de partidos políticos ou de expressão livre. Nela se incluem um conjunto de valores que são, eles também, de civilização, uma vez mais, repita-se, detectáveis a Ocidente e a Oriente. O respeito pelo indivíduo como sujeito de direitos fundamentais e inalienáveis é, provavelmente, a síntese desse conjunto de pressupostos, ainda que eles possam ser interpretados de formas várias, conforme as sensibilidades políticas. Mas, seja-se mais ou menos liberal, socialista, democrata-cristão, ou de outra família democrática, há sempre um mínimo ético comum que nos une e que, face ao despostismo, cava uma abissal diferença.

Nestes acontecimentos recentes que têm vindo ao de cima nalguns países islâmicos, esta distinção é bem evidente e reforça o valor da democracia, do sufrágio universal e da defesa dos valores da liberdade e da tolerância, e deverá mesmo delimitar a fronteira entre o que um espírito liberal deve considerar tolerável e intolerável. Nessa medida, o «conflito» em curso pode ser efectivamente considerado como um conflito de civilizações. Mas não entre o Ocidente e o Oriente, o Bem e o Mal, o judaico-cristianismo e o islamismo. Mas entre a cultura da liberdade e a condição de escravidão.

09 fevereiro 2006

upa opa

A oferta pública de aquisição da PT apresentada pela SONAE, ainda que não vá por diante, teve já alguns evidentes méritos.
Desde logo, desmascarou essa falácia das ditas empresas privadas, outrora empresas públicas, que continuam dominadas pelo Estado. Está visto que o destino da operação e da empresa será ditado pelo governo e não pelo mercado, como deveria ocorrer num regime de livre concorrência.
Depois, permitiu evidenciar o nível de interesses que giram em torno da empresa em causa, nos quais só de se ouvir dizer que podem ser bulidos provocam um reboliço tremendo. A oferta de Belmiro foi vista como hostil, mas esta «hostilidade» é mais um sinónimo de insolência e de atrevimento do que outra coisa qualquer: como pode um tipo do norte, afastado dos grandes centros de decisão política, que sempre foi independente de tudo e de todos, ter a pretensão de entrar na mais bem cuidada e protegida quinta do regime?
Evidenciou, ainda, as fragilidades e deficiências do nosso sistema económico: se um empresário da dimensão de Belmiro tem e terá as dificuldades anunciadas e que se adivinham para agir no mercado, imagine-se o que não será com um pequeno ou médio empresário.
Por último, o resultado final da operação demonstrará se Portugal continua ou não a dispor de uma economia intervencionada, em sistema socialista de domínio público estadual, ou se está, de facto, disposto a deixar o mercado funcionar. O que será decisivo para o futuro do país nas próximas décadas.

fins pacíficos

Neste agradável cenário, são obviamente de manter as gentilezas com que a Europa tem lidado com o programa nuclear do Irão e insistir na via do diálogo. Chirac, Solana e Freitas do Amaral hão-de certamente dar conta do recado. Até porque, como já garantiram as credíveis autoridades daquele país, o programa destina-se a fins pacíficos, humanitários até. Quem sabe, medicinais? Provavelmente, para «tratar da saúde» ao maior número possível de pessoal.

guerra

O Senado dos EUA acaba de ser evacuado sob ameaça de um produto químico desconhecido, provavelmente gás venenoso. A CNN tem estado a cobrir em directo a evolução dos acontecimentos, não se sabendo, até agora, se o alarme disparou com ou sem razão.
Mas, com ou sem motivo real, o estado de alarme em que se vive no território norte-americano, como um pouco por toda a parte, é bem demonstrativo de um facto que apenas a Europa comunitária parece continuar a evitar: o mundo está em guerra. Uma guerra sem território definido, logo uma guerra verdadeiramente global; com um ou vários inimigos declarados mas difíceis de precisar; e que não obedece aos paradigmas clássicos, que terminaram definitivamente com o fim do Império Soviético e do mundo bipolar em que vivemos durante décadas. Para todos efeitos, uma guerra mundial, cuja escalada só agora começou e que poderá ter desenvolvimentos imprevisíveis, porque é precisamente a primeira do seu género. A mais perigosa de todas, portanto.

08 fevereiro 2006

COMUNICADO - CONVITE
Na próxima 5ª feira, 9 de Fevereiro, pelas 15 horas, um grupo de cidadãos portugueses irá manifestar a sua solidariedade para com os cidadãos dinamarqueses (cartoonistas e não-cartoonistas), na Embaixada da Dinamarca, na Rua Castilho nº 14, em Lisboa.
Convidamos desde já todos os concidadãos a participarem neste acto cívico em nome de uma pedra basilar da nossa existência: a liberdade de expressão.
Não nos move ódio ou ressentimento contra nenhuma religião ou causa. Mas não podemos aceitar que o medo domine a agenda do século XXI.
Cidadãos livres, de um país livre que integra uma comunidade de Estados livres chamada União Europeia, publicaram num jornal privado desenhos cómicos.
Não discutimos o direito de alguém a considerar esses desenhos de mau gosto. Não discutimos o direito de alguém a sentir-se ofendido. Mas consideramos inaceitável que um suposto ofendido se permita ameaçar, agredir e atentar contra a integridade física e o bom nome de quem apenas o ofendeu com palavras e desenhos num meio de comunicação livre.
Não esqueçamos que a sátira – os romanos diziam mesmo "Satura quidem tota nostra est" – é um género particularmente querido a mais de dois milénios de cultura europeia, e que todas as ditaduras começam sempre por censurar os livros "de gosto duvidoso", "má moral", "blasfemos", "ofensivos à moral e aos bons costumes".
Apelamos ainda ao governo da república portuguesa para que se solidarize com um país europeu que partilha connosco um projecto de união que, a par do progresso económico, pretende assegurar aos seus membros, Estados e Cidadãos, a liberdade de expressão e os valores democráticos a que sentimos ter direito.
Pela liberdade de expressão, nos subscrevemos

Rui Zink (916919331
Manuel João Ramos (919258585)
Luísa Jacobetty

coito pitta

É o nome do desassombrado deputado do PSD-Madeira que fez esta genial proposta. A alargar a todos os titulares de cargos de soberania das Ilhas e do Continente. Uma ideia destas é uma malha em cheio, caro Pitta. E é de homens como você, estimado Coito, que a Pátria precisa.

barões assinalados

O Barão de Horta e Costa foi forçado a vir hoje a terreiro em defesa do Reino de Portugal, dos Algarves e do Império dos Brasis.
O fidalgo português, um dos mais proeminentes da Corte de S. Majestade, Chanceler-Mor da Real Companhia Portuguesa de Comunicações e Transmissões Terrestres e Marítimas, fez a sua intervenção na qualidade de representante de um dos mais altos expoentes do génio empreendedor português, que se tem afigurado imprescindível na consolidação do Império e na difusão da Cristandade.
A Companhia, tradicionalmente dirigida por um dos Grandes do Reino, dispõe de Carta de Alvará e de Estatuto próprio, embora só possa tomar decisões de fundo com a autorização d’El Rei, que nela possui uma posição de privilégio, ou doirada, sem, no entanto, ter aí empenhado os seus cabedais. Encontra-se dividida em três áreas, cada uma correspondente a diferentes, mas igualmente eficientes, serviços: a secção columbófila, composta de quinhentos pombos habilitados a voos de alcance continental para transmissão de comunicações breves; a secção da malaposta, com cento e cinquenta bestas montadas a operarem no Reino e na Europa Cristã para mensagens e encomendas de maior porte; e a secção marítima, com duas caravelas destinadas aos Brasis e ao resto do Império.
Como ontem foi notícia no Paço, um burguês do Porto e seu filho, proprietários de uma vasta cadeia de vendas e de feitorias, tentou comprar a Companhia, oferecendo por ela uma quantia que o Barão qualificou como uma «insolente ridicularia». S. Excelência acrescentou, também, que não consta que o dito burguês disponha de cabedais suficientes para tamanha empreitada, nem de visão para o negócio, deixando cair a suspeição de o dito cujo estar ao serviço de interesses inimigos de Portugal, quiçá de Castela. Reforçou a sua indignação com uma nota de fervor patriótico, perguntando: «Quem levará Portugal aos Brasis, se as nossas duas caravelas naufragarem? Quem? Quem?». A pergunta não obteve resposta.
Os artesãos e obreiros da Companhia, fazendo-se representar pelas suas guildas e corporações, manifestaram veemente repúdio pelas intenções do burguês nortenho, a quem não reconhecem competência para tão exigente empresa, preferindo-a nas nobres mãos de quem está, revelando assim uma saudável e promissora aliança entre a nobreza e o povo de Portugal, tão característica da nossa alma lusitana.
Ao fim da noite, o audacioso e hostil burguês mandou o filho avisar El Rei que não dará «nem mais um dobrão» pela Companhia e que espera que lhe não dificultem a vida e não o façam perder muito tempo.

07 fevereiro 2006

god save the queen

Parece que o Partido Conservador britânico se prepara para continuar na senda do disparate por onde tem andado nos últimos anos.
Desta vez o seu actual líder, David Cameron, adiantou que, caso venha a ser primeiro-ministro, irá promover reformas constitucionais profundas, nomeadamente, retirar o poder de declaração de guerra ao chefe do Governo e transferi-lo para o Parlamento, assim como também se propõe reflectir sobre os poderes que cabem ao chefe de Estado (o Rei), presume-se que para os aumentar, já que diminui-los é praticamente impossível (vd. edição do Público de hoje, link indisponível).
Obviamente que estas sugestões, aparentemente simpáticas, não podem deixar de ser um puro exercício de demagogia ou de irresponsabilidade política. É que, na verdade, no sistema de governo britânico a eleição dos deputados da Casa dos Comuns é feita através de um método eleitoral (círculos uninominais de eleição por maioria simples numa só volta) que praticamente garante a maioria absoluta a um dos dois principais partidos do sistema. Daí decorre uma dependência directa do grupo parlamentar maioritário para com o primeiro-ministro (que, de resto, como todos os ministros do governo, tem de ser eleito para o Parlamento), que levou alguns analistas a qualificar o sistema como de «presidencialismo do primeiro-ministro». Reforçar, assim, a autonomia real do Parlamento face ao Governo, implicava modificar o sistema eleitoral e, na essência, o ancestral sistema de governo do país. Quanto aos poderes do Rei, o evolucionismo constitucional britânico foi-os diminuindo ao longo do tempo, remetendo-os para a simples representação protocolar do Estado. Nem poderia ser de outra maneira num país democrático, onde se presume que o poder político dos governantes carece sempre de mandato expresso dos seus legítimos titulares que são os cidadãos. A não ser assim, estar-se-ia a legitimar um poder recebido por herança, o que nem é um critério propriamente democrático, nem vai ao encontro da tradição inglesa, menos ainda da sua história constitucional.
Está visto que com lideranças e propostas deste calibre, vamos ter Tony Blair ainda por mais uns anos. O que, se calhar, até é preferível.

ingenuidade e tragédia

O princípio da igualdade dos Estados na comunidade internacional tem pautado as relações internacionais nas últimas décadas, e permitido graves atropelos aos mais elementares direitos humanos.
Efectivamente, os Estados não são todos iguais e pretender tornar igual o que é diferente é um erro crasso, com consequências imprevisíveis a este nível. Na verdade, há Estados que respeitam a liberdade de expressão e outros não; há Estados onde existe liberdade política e noutros não; há Estados que reconhecem a igualdade dos sexos e outros não; há Estados que são ditaduras e outros não; há Estados que são laicos e outros não; há Estados que respeitam a propriedade privada e outros não; há Estados com instituições credíveis e respeitáveis e outros não; há Estados que tiranizam os seus povos e outros não.
Por isso, esta imensa cautela ocidental em lidar com Estados terroristas ou que são dominados por fanáticos e ditadores, como se fossem dirigidos por gente respeitável em quem se pode confiar, é, mais do que um absurdo provocado por traumas civilizacionais e ideológicos, uma negligência grosseira e perigosa. No tempo em que vivemos, as consequências de tamanha ingenuidade podem ser irreversíveis para o mundo livre. Ainda em plena guerra fria, Raymond Aron advertia que «les fanatiques ne manquent pas qui mettent la victoire de leur idéologie au-dessus de tout» («Paix et guerre entre les nations»). Parece que os países democráticos se têm esquecido disso nos últimos tempos. Como não ocorreu, em 1938, a Neville Chamberlain que as intenções de Hitler não fossem as melhores. De tal modo, que assinou com ele um célebre acordo de paz, o Acordo de Munique, em 29 de Setembro daquele ano. Poucos meses mais tarde, a 1 de Setembro de 1939, a Wehrmacht invadia a Polónia e, algum tempo depois, as bombas nazis caiam sobre Londres.

06 fevereiro 2006

laicização e liberdade

Não deixa de ser curioso constatar que uma boa parte do Ocidente que repudia os actos de barbárie recentemente ocorridos nalguns países islâmicos contra representações diplomáticas europeias, seja a mesma que enaltece a Palestina contra Israel, que condena as intervenções norte-americanas no Afeganistão e no Iraque, que clama pela defesa da soberania do Irão na questão nuclear, ou que displicentemente costuma desculpar atitudes igualmente agressivas em relação aos norte-americanos.
Reiteradamente, os fundamentos encontrados para justificar aqueles comportamentos são políticos e culturais: contra a influência americana na zona, alicerçada no seu aliado Israel, e em defesa da especificidade cultural do islamismo que, em última instância, à luz desses olhos tolerantes, justifica os mais graves atentados à liberdade cívica, política e mesmo até de género sexual.
Sucede que o que nos distingue está muito além de simples opções políticas ou tradições culturais diversas. O Islão e o mundo muçulmano não diferenciam a sociedade da religião, o Estado da Igreja, a Cidade de Deus da Cidade dos Homens, em suma, o Céu e a Terra. Convém não esquecer que o fundador do islamismo, Maomé, foi simultaneamente um líder religioso e político. Foi o profeta a quem Alá ditou, ao longo de vinte e dois extensos anos, o Alcorão, mas foi também o conquistador de Medina, de Meca e o unificador da Arábia. O Alcorão é, de resto, não só um livro de preceitos religiosos, mas também de normas sociais, políticas e jurídicas. Não obstante as diversas Escolas jurisprudenciais do direito islâmico (Fiqh) se fundarem sobre a autoridade de juristas com diferentes interpretações do Corão, é sempre sobre este e os seus versículos que as decisões são tomadas. Por conseguinte, a liberdade individual não se concebe fora da esfera do divino: há que ter presente que «Islão» significa «submissão à vontade de Deus» e que um «muçulmano» é aquele que assume voluntariamente essa condição de sujeição. Para um crente, o fundamento primordial da sua existência individual – a «Jihad maior» - consiste no conflito interior que tem de travar ao longo de toda a vida para dominar a sua alma e evitar que ela resvale para o caminho impuro do mal. A outra «Jihad», a menor, é a guerra santa contra os inimigos expressos da fé, para a qual todos os muçulmanos se devem disponibilizar.
Os fundamentos do islamismo são, por conseguinte, totalitários. Não estabelecem, ao contrário do cristianismo, a distinção entre o temporal e o espiritual, o mundo terreno e o mundo divino. A dimensão humana é inseparável desses dois planos. A separação do «reino de Deus» e do «reino de César» não existem e, por isso, a esfera do divino invade a totalidade da existência humana. Tal como a sociedade e a sua forma de organização política, que não distingue o Estado laico do Estado religioso ou mesmo clerical, como sucede no Irão e sucedeu no Afeganistão dos talibans. Nessa medida, falar ao Islão nos valores do Homem, na liberdade individual, ou seja, em tudo que seja especificamente humano, é tocar-lhes num mundo cuja existência não reconhecem.
Como sucedeu isto com povos que, em tempos, foram expoentes de civilização, o que sempre obriga à prevalência da liberdade, é uma questão que poderá não ter uma única resposta, mas tem certamente uma causa principal. É que o que distingue estes dois mundos, agora e desde há muito em choque, é exactamente a natureza laica e religiosa de cada um deles. Enquanto que o cristianismo permitiu, pelos seus próprios fundamentos originais e por alguma da doutrina que dele se desenvolveu, a laicização das sociedades onde foi e é a religião dominante, o islamismo nascido no século VII tem, ao invés, seguido um caminho contrário. Se a isto associarmos um atraso civilizacional provocado por «colonizações» interesseiras, por uma geopolítica que criou Estados sociologicamente duvidosos e onde se instalaram autocracias ditatoriais suportadas nas oligarquias do petróleo, temos uma quase explicação para o óbvio atraso em que vivem os povos submetidos ao islamismo. Essa é, no fim de contas, a razão deste tipo de comportamentos: o subdesenvolvimento de povos inteiros, submetidos a um poder totalitário, que não separa a religião do homem, nem permite que o façam. A liberdade individual e cívica, tal e qual a concebemos, não tem aqui qualquer significado, nem é sequer um conceito inteligível.

03 fevereiro 2006

haja pudor!

Sei bem que Francisco Sá Carneiro foi sempre um homem polémico dentro do seu próprio partido. Que, por mais do que uma vez, o tentaram afastar, destituir e trair. Como, também, não ignoro que depois de morto a sua memória tem sido pouco respeitada. Que a sua imagem tem servido toda a sorte de arrivismos e evocações místico-políticas, tendo mesmo chegado a figurar num cartaz de propaganda eleitoral vinte e quatro anos depois de morto. É certo que a gratidão dos homens não é um valor em alta e que está em uso maltratar aqueles a quem devemos respeito e consideração. Mas, caramba, para tudo tem que haver limites!

afinal o presidente também «governa»?

Eis a melhor resposta àqueles que, nos últimos meses, vinham insistindo na «despresidencialização» do nosso sistema de governo. Se já é assim e o homem ainda não tomou posse, imaginem como será quando assentar arrais em Belém. É como diz o outro: vão-se habituando, que depois custa menos.

02 fevereiro 2006

quiz liderança

A direita portuguesa parece-lhe mal? Acha que tem um défice de liderança e que assim não vai lá? Julga-se capaz de fazer melhor e sente que tem alma de um verdadeiro líder? Responda ao teste e veja os resultados.

1 – Para si Portugal é:
a) o sítio onde nasci, onde tenho os meus amigos, uma comunidade a que pertenço;
b) do Minho a Timor;
c) o Quinto-Império;
d) um lugarejo na Europa onde os avós tinham as quintas;
c) a minha amada pátria, um destino colectivo.

2 – O Nacional-Socialismo foi:
a) uma forma brutal de socialismo;
b) um socialismo de rosto humano;
c) a barbárie;
d) um grupo de amigos do Avô;
e) o nome do PS na clandestinidade.

3 – O nome «Santana» fá-lo recordar:
a) bronca;
b) xutos e pontapés;
c) o «Páteo das Cantigas»;
d) o amigo da Tecas, a minha irmã de vinte anos;
e) uma traição presidencial.

4 – Quem foi Hayek:
a) um «Austríaco»;
b) um traidor à raça;
c) um utópico;
d) um alemão amigo do Avô;
e) Hayeck?, o novo avançado-centro do Benfica?

5 – E von Mises?
a) outro «Austríaco»;
b) um camarada que trabalhava em Auschwitz;
c) outro utópico;
d) mais um amigo do Avô;
e) o quê?, o Viera tem pastel para mais um alemão?

6 – Sócrates evoca-lhe:
a) o socialismo;
b) as origens da raça;
c) um filósofo;
d) o Primeiro-Ministro que desgraçou a pátria;
e) sicuta.

7 – Em Belém, Cavaco fará:
a) mais ou menos o mesmo que os seus antecessores;
b) traições ao Portugal Eterno;
c) uso do seu poder moderador;
d) maldades a Mendes;
e) maldades a Sócrates e a Portas.

8 – Para si, o liberalismo é:
a) uma filosofia;
b) uma invenção dos americanos e dos judeus;
c) uma bela mas impraticável teoria;
d) um grupo jacobino-maçónico que roubou as quintas ao Avô;
e) um exagero e uma inutilidade.

9 – Tendo como referência a cidade do Porto, indique qual destes nomes corresponde ao de um dos muitos e notáveis dirigentes locais dos partidos da direita:
a) não sei, não conheço;
b) são todos uns traidores!;
c) o dr. Miguel Veiga;
d) Camilo Castelo Branco;
e) Marco Horácio.

10 - Um aparelho partidário é:
a) uma chatice;
b) a expressão maior do esforço militanta;
c) um grupo de cidadãos dedicados à causa pública;
d) uma maquineta que usei nos dentes até aos trinta anos;
e) a seiva da democracia.

11 – No futuro, se quiser voltar ao poder, a direita tem de:
a) mudar;
b) ir ao ginásio muscular-se;
c) futuro, presente?
d) ouvir os conselhos do Avô;
e) fazer muitos almoços de carne assada com o povo.

Resultados
Se respondeu maioritariamente:

A – você é um tipo esquisito. Se calhar nem é de direita. Jamais será eleito para cargos políticos. Não lhe vejo futuro por aqui.
B – você está um pouco atrasado no tempo. No passado as suas ideias tiveram algum sucesso, mas agora já não dá. Veja se se acalma e domina a agressividade. Tome Lexotan.
C – você é um utópico. Um romântico político. Um especulativo, em suma. Vá ler o Padre António Vieira e deixe a liderança e a acção para quem sabe da coisa.
D – está quase lá! Não fosse essa sua mania de não se misturar com o povo e, quem sabe, poderia ir longe.
E – homem!, você é um líder nato! De que está à espera para enveredar por uma carreira política a sério? Mexa-se, caramba! O país, a direita, todos precisamos de si.

01 fevereiro 2006

mais um argumento

A acrescentar a estes. Portugal e os portugueses não estão preparados para o liberalismo. Ou, plagiando o Doutor Marcello Caetano, a democracia é um belo sistema, mas em Inglaterra. Cá não funciona.

casamento

Segundo a lei civil (artº 1577º do CC), o «casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida». Verifica-se, assim, que o objecto deste contrato é a «constituição de família», subentendendo esta a uma «plena comunhão de vida». Nos fins da existência da «família» incluí-se, naturalmente, a procriação, razão pela qual se impõe a diferença de sexos como elemento típico do contrato. As disposições sobre o regime de bens, os modos e as causas de dissolução do contrato, a filiação, etc. são decorrentes desta finalidade essencial: a constituição de família por via contratual.
Ora, esta noção está absolutamente desfasada dos dias de hoje, onde existem inúmeras famílias estáveis sem casamento civil ou católico, e, pelo contrário, onde inúmeros casamentos que geraram família terminam e são mesmo substituídos por outros em idênticas circunstâncias. Na linha de raciocínio do legislador, quem tivesse já constituído uma família não deveria ser autorizado a constituir uma outra, pelo que o divórcio não teria cabimento legal. Como, também, seria duvidoso que um casamento sem filhos se pudesse, em bom rigor, manter juridicamente.
Obviamente que estas disposições da nossa lei civil estão desfasadas no tempo e dizem respeito a uma época que já não é a nossa. O «casamento para a vida» acabou, ou quase não existe, como já não perdura a família estável e única: os divórcios crescem em flecha e é comum que as pessoas tenham, ao longo das suas vidas, mais do que um casamento, constituindo famílias e tendo descendência de mais do que um parceiro.
Se isto é bom ou mau, não sei. Mas sei que é assim e que a lei não deve escusar-se a reconhecer a realidade do mundo a que se destina. Nessa medida, e ainda que a regulamentação dos institutos conexos pudesse estabelecer distinções, o casamento deveria ser definido como «o contrato de vida em comum celebrado por duas pessoas». Mais nada.

«de boas intenções está o inferno cheio»

Escreve o João Miranda, no Blasfémias: os liberais não podem ter a ilusão que as ideias determinam os factos sociais. Na caixa de mensagens do «post», o AAA e o RAF parecem discordar deste ponto de vista, achando que as ideias podem influenciar o jogo da política.
Paradoxalmente, têm os três razão: na verdade, as pessoas que agem politicamente fazem-no, na maior parte das vezes, por ideias e valores que defendem; como, também, o próprio mercado eleitoral decide em função do que lhe dizem os líderes dos partidos e de um módico, por mais reduzido que seja, de progamação governativa que eles lhes transmitam. A história do mundo está cheia de revoluções e de outros actos de voluntarismo político em defesa de ideologias. A do século XX, em particular, foi disso um excelente exemplo. Infelizmente. Porque, como diz o velho ditado, «cheio de boas intenções está o inferno», o que para aqui transposto, quer dizer que as ideias dos políticos surtem, sem dúvida, resultados sobre os indivíduos e as sociedades. Muito raramente, contudo, coincidem os efeitos reais com os pretendidos ou com os anunciados. Porque, de facto, a ordem política é, ela também, espontânea, ainda que por vezes leve tempo a que as coisas tomem o seu justo lugar.